Acadêmica surda foi a oradora da turma na formatura do curso de Pedagogia.

O mundo não é só dos ouvintes.

O desafio de viver num mundo de ouvintes não foi empecilho nenhum para que Jaqueline Zanchin Fetter, 28 anos, aceitasse ser a oradora da turma de formandos do curso de Pedagogia, no dia 8 de fevereiro. Quatro intérpretes da Língua de Sinais traduziram a emoção da formanda para os presentes à solenidade.

Durante toda a sua graduação, Jaqueline contou com um apoio fundamental: o do Programa de Integração e Mediação do Acadêmico - PIMA, criado em 2007 com a finalidade de dar a assistência aos alunos que possuem necessidades educacionais específicas. Nesses padrões se encaixam os estudantes que têm transtornos emocionais, dificuldades de aprendizagem, deficiências físicas e sensoriais e demais dificuldades relacionadas à saúde. A proposta é ajudar a eliminar barreiras, não só arquitetônicas, mas também culturais e sociais, além de inibir a segregação e a exclusão de qualquer natureza.

Até mesmo no estágio curricular, realizado na Escola de Educação Infantil da UCS, as intérpretes acompanharam Jaqueline. A experiência com crianças de quatro anos marcou a sua vida pela curiosidade que elas tinham. "Me perguntavam: você tem língua? Mostrei a língua. Tu fala inglês? Respondi: - não falo inglês, uso as mãos. E eles riam... Procurava contar estórias com expressão. Eles me olhavam com atenção e a intérprete traduzia pelo oral. Ficou ótimo!"

Os desafios fazem parte da trajetória de Jaqueline. Leitura, discussão, a troca de ideias entre colegas ouvintes – era a única surda na sala de aula. Desafio também para professores, pois nem todos têm conhecimento da Língua Brasileira de Sinais – a língua materna de Jaqueline. Provas e trabalhos não eram diferenciados dos outros colegas, porém os professores aceitavam a forma como a aluna escrevia. Jaqueline explica que nunca faltou intérprete na sala de aula. "Esse apoio do PIMA foi muito importante para mim e para os professores: imagina o que aconteceria se faltasse o intérprete? Tudo ficaria perdido! Algumas vezes os professores esperavam o intérprete chegar na sala para iniciar a aula."

Em muitos de seus trabalhos e artigos – a formanda também atuou como bolsista de iniciação científica – ela usou a sua realidade como exemplo. Na disciplina de Oralidade e Letramento, a professora liberou para que ela substituísse a oralidade por cultura surda.

Atualmente, Jaqueline é auxiliar administrativa em uma empresa, já ensinou Libras para funcionários e, para o futuro, espera que novas portas sejam abertas. Aos ouvintes ela dá uma dica: "Não ignore quando você tem um colega surdo. Tenha coragem de se comunicar: escreva no papel ou faça um gesto qualquer. Esse é um começo de comunicação. E, às empresas, que recebam currículos de surdos. Trabalhar com eles talvez seja o melhor para sua empresa."

Foto: Sandra Rissinger/Estúdio Thaís Bachi.