Irmã Rosália Theresa Pegoraro (1924-2015): pioneira no ensino de enfermagem em Caxias do Sul e região.

Faleceu no dia 20 de janeiro, em Garibaldi, aos 90 anos, a senhora Rosália Theresa Pegoraro, uma das fundadoras da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês e do curso de Enfermagem da UCS, onde participou da formação de várias gerações de enfermeiros, numa perspectiva humanista de valorização e respeito ao ser humano em todas as suas dimensões.

Nascida em Antônio Prado em 13 de outubro de 1924, Irmã Rosália - designada no ambiente religiosos como Irmã Sebastiana Maria Pegoraro - fazia parte da Congregação Irmãs de São José de Chambéry, entidade que mantém como missão "levar aos doentes fé, esperança, caridade e oração". Seguindo os preceitos da sua Congregação, Irmã Rosália, dedicou-se ao atendimento aos doentes procurando humanizar a prática da enfermagem e atuando diretamente na formação de novos profissionais.

Irmã Rosália foi uma das responsáveis pela implantação, na década de 1950, da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês, entidade constituída pela Sociedade Caritativo-Literária São José, onde atuou como professora e exerceu o cargo de diretora no período entre 1956 e 1960. Na sua gestão à frente da Escola implantou, em 1957, no Hospital Nossa Senhora de Fátima, o primeiro curso de formação superior de profissionais para o exercício da enfermagem.

Em outubro de 1968, com a incorporação da Faculdade de Enfermagem à Universidade de Caxias do Sul, Irmã Rosália ingressou na UCS, sendo designada pelo reitor Virvi Ramos para a direção da Faculdade. Em sua trajetória na Universidade, Irmã Rosália combinou a atividade docente com cargos de gestão. Graduada em Enfermagem e especialista em Serviço Social, ela foi coordenadora de curso, chefe de departamento e diretora do Centro da Saúde, aposentando-se em 2004, aos oitenta anos. Pela importância de sua atuação como educadora, Irmã Rosália foi homenageada pelos alunos que deram seu nome ao Diretório Acadêmico do Curso de Enfermagem da UCS.

Detalhe do evento de comemoração dos 50 anos 
da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês e da 10ª 
Semana Internacional de Enfermagem, em 2004, no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, 
com a participação da 
Irmã Rosália Pegoraro e da professora Nilva Lúcia Rech Stédile. Foto: CEDOC/IMHC

"Detalhe do evento de comemoração dos 50 anos da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês e da 10ª Semana Internacional de Enfermagem, em 2004, no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, com a participação da Irmã Rosália Pegoraro e da professora Nilva Lúcia Rech Stédile. Foto: CEDOC/IMHC".

"Ela apresentava aos seus alunos e desenvolvia neles uma perspectiva humanista, que valorizava o ser humano e o cuidado como tarefa principal do enfermeiro e do trabalhador em saúde".

A professora Nilva Lúcia Rech Stédile, que conviveu com Irmã Rosália, primeiramente como aluna e mais tarde como colega de departamento, conta que a educadora amou a enfermagem e a docência de forma a contagiar a todos os seus alunos e colegas. Na entrevista concedida ao site da UCS, ela fala da antiga professora e colega.

Como foi a sua convivência, como aluna e posteriormente como colega do Departamento de Enfermagem, com a Irmã Rosália Theresa Pegoraro?
A Irmã Rosália marcou muito a minha turma de formandos de enfermagem e penso que várias gerações de enfermeiros, pela sua forma de entender e de fazer a enfermagem. Ela apresentava aos seus alunos e desenvolvia neles uma perspectiva humanista, que valorizava o ser humano e o cuidado como tarefa principal do enfermeiro e do trabalhador em saúde. Mesclava um jeito meigo de ensinar com uma firmeza na percepção de detalhes que faziam a diferença entre uma técnica bem executada e uma realizada para cumprir com o ritual acadêmico.

Ela nos introduzia no mundo da técnica e nos acompanhava em diferentes momentos da formação, sempre acrescentando conhecimentos e experiências importantes que nos ajudavam a construir um ser enfermeiro mais humano, capaz e determinado. Também nos introduzia no mundo do ensino, ministrando disciplinas da Licenciatura em Enfermagem, desenvolvendo em nós uma responsabilidade para com o papel de educadores e as habilidades pedagógicas necessárias para o cumprimento de mais essa função. Como colega sempre deixou muito claro seu amor pela docência. Amor esse que fazia com que buscasse o aprimoramento das aulas e o reconhecimento do enfermeiro como profissional fundamental na área da saúde. Olhando sua trajetória, posso afirmar que ela amou a enfermagem e a docência de forma a contagiar a todos seus alunos e colegas.

Como você avalia a importância da Irmã Rosália para a prática e o ensino de enfermagem em nossa região? E especificamente para o curso de enfermagem da UCS?
Irmã Rosália foi uma pioneira. Buscou capacitação em São Paulo (segundo o que ela própria me relatou) para cumprir com uma incumbência que a Congregação das Irmãs de São José lhe haviam definido: criar uma escola de enfermagem em Caxias do Sul. Assim, liderou um pequeno grupo de professoras e iniciou suas atividades em um dos Hospitais de Caxias do Sul, iniciando definitivamente o processo de profissionalização da profissão e ajudando a re-construir a imagem desse profissional na sociedade regional.

Quando a UCS foi criada, esta Faculdade que se chamava Escola de Enfermagem Madre Justina Inês, foi incorporada à de Belas Artes e de Direito, para constituir a Universidade. Sua importância foi fundamental tanto para a profissão, como para introduzir definitivamente o campo da saúde como um dos que deveriam constituir a UCS. Assim, assumiu a direção do Centro da Saúde e vários outros cargos, consolidando definitivamente a enfermagem como um importante curso na Universidade. Sua iniciativa resultou em um contingente significativo de enfermeiros que se distribuem principalmente na região e no Estado do RS, mas também por todo o País.

Que bases ela deixou para as gerações futuras de enfermeiros?
Resumo seu legado em três pilares principais:
Ame sua profissão: para ser enfermeiro você precisa amar ao outro, respeitar o ser humano em todas as suas dimensões;
O cuidado é a essência da profissão, portanto, procure exercê-lo com o máximo de competência e seriedade;
Um enfermeiro é um educador: procure aproveitar os espaços de cuidado como oportunidades para ensinar algo de bom e de útil ao paciente (na época o foco era a enfermagem hospitalar).

Como ela era como professora e gestora?
Era uma pessoa amável, doce, solidária, dona de um português impecável e extremamente cuidadosa com as palavras. Sua docilidade, no entanto, não diminuía a seriedade com que conduzia a gestão acadêmica e o ensino, buscando sempre extrair de cada um o que tinha de melhor. Combinava maravilhosamente esses dois aspectos. Dois outros aspectos marcavam sua forma de ser: sabia gerenciar situações de conflito e enrubescia diante de situações cotidianas. Assim como seu conhecimento da profissão ajudou a construir um perfil de enfermeiro, suas faces rosadas também ajudaram a marcar sua fisionomia e jeito de ser.

Que exemplos ou ensinamentos da Irmã Rosália você aplica na sua atuação docente?
Na dimensão pedagógica, aprendi ainda como aluna, que a sala de aula precisa ser pensada como espaço de criação e de construção de conhecimentos. Assim, cabe ao professore conduzir esta tarefa com o máximo de empenho, no sentido de favorecer a aprendizagem. Cada aula é importante e deve ser pensada, planejada e executada como tal.

Na dimensão técnica, como enfermeira, aprendi a cuidar de detalhes e valorizar a técnica como meio para prestar o cuidado. O ser humano é o essencial e deve ser valorizado em cada encontro.

Na dimensão da gestão, aprendi que todos têm o direito de serem ouvidos. Portanto, toda decisão no campo da gestão parte da escuta detalhada e cuidadosa dos envolvidos em determinada situação. Como ela dizia: isso nos ajuda a errar menos e a sermos o menos injustos possível.

Espero que na dimensão que ela estiver, esteja desfrutando de tudo que construiu como docente, enfermeira e colega e que, ao assistir à continuidade de seu trabalho, tenha orgulho de ter feito parte desta história.

Dissertação de Mestrado registra a história da enfermagem em Caxias do Sul.

A história da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês e da implantação do ensino de enfermagem em Caxias do Sul e Região foi tema da Dissertação do Mestrado em Educação, defendida em 2012, pela enfermeira e docente do curso de Enfermagem da UCS, Edlaine Cristina Rodrigues de Almeida, com orientação da professora Terciane Ângela Luchese. Durante suas pesquisas, Edlaine encontrou-se por várias vezes com a Irmã Rosália. "Ela conversava sobre a enfermagem de uma forma encantadora, mostrando um saudosismo da época em que atuava, revelando um sentimento de ... que pena, aquela época não volta mais... mudaram tantas coisas... um dia eu vou lá na Universidade.... Ela também esclareceu que as alunas da primeira turma de formandas da Escola não eram freiras. O traje era religioso, podendo ser interpretado pelas imagens da época como se todas fossem religiosas, mas ela dizia que era assim demonstrar uma disciplina, um padrão, para não deixar essa variedade de trajes que hoje são utilizados nos. Para mim, ela foi de suma importância para a enfermagem em Caxias do Sul, pois foi também com o esforço desta mulher e enfermeira que ocorreu o início da profissionalização da enfermagem em Caxias do Sul. Foi uma honra ter conhecido Irmã Rosália - ou como era designada Irmã Sebastiana Maria Pegoraro - e escrever sobre esta pessoa mesmo que de uma forma tão breve, pelo menos neste momento. Burke (1992, p. 11) refere tudo tem uma história e aqui a Irmã Rosália deixa a sua".

Intitulada História da Escola de Enfermagem Madre Justina Inês: uma instituição de ensino superior formando enfermeiras em Caxias do Sul/RS (1957-1967), a dissertação faz parte do acervo da Biblioteca Digital de Teses e Dissertações da Universidade, com acesso pelo site da Biblioteca e pela página do Mestrado em Educação.

Fotos: CEDOC-IMHC e reprodução de imagem que integra a galeria de diretores do Centro das Ciências Biológicas e da Saúde.