ACOLHIMENTO, EMPATIA, DIÁLOGO E TRANSPARÊNCIA

A arte da convivência envolve interação empática com o outro mesmo em momentos de conflito, levando em conta uma fórmula complexa através da qual o resultado será a potencialização da capacidade de aprendizado e o crescimento pessoal e profissional

ANA LAURA PARAGINSKI | alparaginski@ucs.br
Fotos: Claudia Velho

Diferenças que multiplicam

Imagine um mundo onde todos fossem iguais, onde todos pensassem da mesma forma, onde não houvesse discordância de opiniões? Você conseguiria viver nesse mundo? Ou você é daquelas pessoas que precisam instigar os diálogos provocando questionamentos?

Costuma-se dizer que a diferença entre perfis de pessoas só vem a somar, mas pode-se pensar que, no caso de uma instituição de ensino, a diferença vem a multiplicar. Para o professor de Filosofia da UCS Paulo César Nodari, "nos identificamos com o que é semelhante, mas o crescimento está na diferença, a diferença é que vai trazer criatividade e crescimento".

Muitas vezes, no ambiente de trabalho ou em sala de aula, costumamos 'deixar de lado' aquela pessoa com a qual não nos identificamos, fazemos de conta que a pessoa não está ali ou não vai entender o que estamos falando. Dessa forma, estamos bloqueando o potencial de acolhimento, de compartilhamento e de harmonização com o outro que, por vezes, nem conhecemos direito. No entanto, também é na diferença entre um e outro que se encontram algumas das maiores virtudes da relação: a de respeitar a opinião, tolerar alguns defeitos (já que todos os temos) e fazer das diferenças que nos caracterizam a completude que sintetiza uma verdadeira convivência harmoniosa. Afinal, o que seria de nós se fôssemos todos iguais?

Para a psicóloga, psicanlista e professora da UCS, Rosita Esteves, para conviver melhor com o que é diferente a nós, é necessário abrir mão da ideia de onipotência e sapiência inquestionável. "Para isso, é necessário reconhecer que somos seres incompletos, no sentido de que sempre nos falta algo, que sempre temos algo a aprender. A partir desse posicionamento interior, o sujeito valoriza o outro, o seu semelhante, como um outro sujeito que tem seus próprios posicionamentos com igualdade de valor", ressalta.

Todo início de semestre, a Assessoria de Relações Interinstitucionais e Internacionais da UCS realiza um encontro de recepção dos novos alunos intercambistas. Neste momento, os estrangeiros aproveitam para se integrar e conhecer um pouco da cultura brasileira.

Escolha e acolhimento

Sentir-se acolhido no ambiente onde está chegando, seja um novo aluno, funcionário ou professor, é algo que pode mudar a maneira com a qual vemos a organização e, em consequência, como desenvolveremos o sentimento de pertencimento ao novo local.

A professora do Programa de Pós-Graduação em Hospitalidade e Turismo da UCS, Marcia Capellano dos Santos, falou aos professores, no início do atual período letivo, sobre o sentido da palavra 'acolhimento'. Entre muitas outras colocações importantes, Marcia ressaltou que o acolhimento é essencial na construção de um novo paradigma orquestrador das relações humano-sociais. "Em tempos de relações líquidas, marcados pela fragilidade, pela fugacidade dos laços sociais, é necessário haver a disposição interna para o acolhimento recíproco", ressaltou. Para a professora, seja na relação aluno-professor ou professor-professor, a aprendizagem é o produto mais nobre do convívio alicerçado no acolhimento.

A psicóloga organizacional da UCS Elizandra Dors ressalta que deve haver um momento de escolha. "Assim como uma organização escolhe os profissionais que irão investir seus esforços diários, que passarão a maior parte do dia se doando para a mesma, há que acontecer o inverso: as pessoas escolherem a organização como seu ambiente de convívio harmonioso e desenvolvimento de um trabalho digno e reconhecido", comenta.

"No que tange à UCS, se o profissional pretende crescer na carreira dentro da própria Instituição, se ele vê que pode mais e que isso lhe deixará mais satisfeito, existe a opção de participar de um recrutamento interno para outra vaga", salienta a psicóloga organizacional Patrícia Bonatto Tisato. "O importante é que o tempo o profissional passa dentro da Instituição seja um tempo de harmonia e de satisfação", esclarece.

Liberte-se das ideias preconcebidas

Para a professora de Psicologia da UCS e membro da equipe do Programa de Integração e Mediação do Acadêmico (PIMA), Cláudia Bisol, para conviver com a diferença é necessário uma abertura para o outro. "Isso passa por várias dimensões, entre elas, uma atenção para com as ideias preconcebidas, prontas, que carregamos conosco. Essas ideias nos impedem de olhar para o outro em seu modo de ser, de estar no mundo, em seu modo de viver. Uma maior abertura para o outro também só é possível se nos dispomos a ouvir mais e a julgar menos, e se nos dispomos a construir juntos estratégias para vencer os desafios que o cotidiano nos apresenta", enfatiza.

Sabemos que interagem, dentro de um ambiente universitário, pessoas das mais diversas origens, hábitos, costumes, cotidianos e ideias. A relação de convivência entre esses distintos modos de viver deve ser apaziguada com muito entendimento de que o espaço aqui, dentro da Universidade, é de democratização dos acessos à educação, de diálogo e construção do conhecimento. "São muitos os que se sentem diferentes dentro de um ambiente universitário, não somente as pessoas com deficiências. O ambiente universitário carrega ainda determinantes históricos muito fortes - trata-se de um ambiente com fortes tendências elitistas e meritocráticas. Portanto, todos os que de algum modo não se adéquam (estudantes pobres, estudantes trabalhadores, estudantes negros, estudantes mais velhos, estudantes com dificuldades de aprendizagem, estudantes de religiões minoritárias, entre outros) podem enfrentar algum nível de preconceito e pouca valorização. Essas pessoas acabam precisando fazer um esforço muito maior para estar nos espaços acadêmicos, pois além dos desafios que uma formação superior coloca em termos de construção do conhecimento, precisam fazer frente a situações nem sempre acolhedoras", explica Cláudia.

Associada à empatia e à escuta verdadeira da fala do outro, a capacidade de aceitar e conviver com as diferenças de pensamentos, escolhas e decisões favorece a boa convivência e reduz os conflitos, pois elimina os esforços para que todos se enquadrem num mesmo modo de pensar e viver. Essa ideia vem ao encontro do que pensa Rosita Esteves: "a boa convivência envolve o compartilhar pensamentos, opiniões e experiências. Para ser efetiva, é imprescindível a empatia, que significa a capacidade de colocar-se no lugar do outro para compreender o significado do que está sendo comunicado. Além da empatia, é de grande relevância que a escuta do que está sendo dito seja neutra, isto é, desprovida de preconceitos e crenças esteriotipadas. Desse modo, pode-se escutar o outro realmente a partir da sua fala e dos significados que tem para o sujeito. O sentimento de menos valia no grupo pode interferir na autoimagem e na autoestima do sujeito, gerando inibição e retraimento e, consequentemente, prejuízos na convivência".

Programa UCS Sênior, que trabalha com a proposta de oportunizar aprendizado e convívio, inicia atividades de 2015 com 1,1 mil alunos matriculados.

A sala de aula

Se existe um local que podemos chamar de ideal para a evolução do conhecimento individual e coletivo, esse local é a sala de aula. Aproveitar esse ambiente para tirar o máximo de aprendizado deve ser o objetivo de qualquer aluno, seja de ensino fundamental, médio, técnico ou na graduação. Para Cláudia, é importante lembrar que a sala de aula é um lugar de conflito, de diferentes visões de mundo, de embate de ideias e de opiniões. "Isto não é algo negativo. Ao contrário, se os conflitos e diferenças puderem ser enunciados, puderem vir à tona, em um ambiente de respeito e valorização do outro, isto poderá ser a porta de acesso ao crescimento de todos. O diálogo, a escuta atenta e a construção conjunta de soluções para as dificuldades pode ser o melhor caminho", finaliza.

"O bom convívio em sala de aula é fundamental para facilitar o processo ensino-aprendizagem, pois a relação que se estabelece entre os sujeitos é determinante para a eficácia das propostas e desafios da aprendizagem. Assim, sentir-se bem em sala de aula por ter uma boa convivência com o professor e com os colegas é essencial", afirma Rosita.

Para tanto, o professor deve desenvolver um olhar atento ao seu grupo de alunos investindo no diálogo em sala de aula. Ainda, acrescenta Rosita, "faz-se importante que o professor os auxilie a refletir sobre sua vida acadêmica dentro do seu projeto de vida, para que o aluno perceba que estar cursando uma disciplina é muito mais que aprender os conteúdos nela propostos, é fazer parte de um objetivo maior que vai culminar na formação de um profissional que dará sua contribuição para a sociedade através de sua atividade profissional futura. Assim, o professor promoverá uma aprendizagem cooperativa, com a participação ativa dos alunos, elementos essenciais para uma boa convivência em sala de aula".

Encontro entre a Reitoria, gestores e funcionários administrativos, ocorrido no dia 31 de março, possibilitou a reflexão sobre responsabilidades na busca da excelência institucional.

Como dar e receber feedbacks

A hora do feedback é de bastante ansiedade para a maioria das pessoas. Sentar-se à frente do líder e escutar o que ele tem a dizer sobre o andamento do seu trabalho e sua produtividade pode figurar entre os piores dramas dos profissionais. Não que isso represente uma tarefa fácil para todo líder. Diante de uma crítica, cada um reage de uma forma. Para as psicólogas organizacionais da UCS, lidar com as frustrações fazem parte do dia a dia de uma organização. "Muitas vezes, é importante que a pessoa repense seu papel dentro da organização e busque não se acomodar. O recrutamento interno está aí para isso e o gestor deve, também, perceber que talvez o profissional possa crescer, mudar, conquistar outro espaço dentro da Instituição", comentam.

O líder deve ter a preparação necessária para dar o feedback aos membros de sua equipe. "A UCS planeja executar um treinamento especial para os gestores a fim de que sejam preparados para lidar com suas equipes de forma madura e responsável, possibilitando espaços de desenvolvimento pessoal dentro de seus setores", comenta Elizandra. Ações como esta visam, entre outras coisas, não desmotivar o profissional.

Transparência

"O pecado, muitas vezes, está no modo com que se fala e não na ideia central da fala", comenta Nodari. Diariamente, vemos profissionais criticando colegas ou sendo criticados. A crítica pode surtir efeitos bons ou ruins, depende do teor do conteúdo e da forma com a qual nos expressamos para realizá-la ou aceitá-la. Para Nodari, a forma com que nos expressamos é que vai gerar o resultado positivo ou negativo sobre o que estamos querendo dizer. Para ele, três princípios norteiam a boa convivência entre as pessoas, seja ela no trabalho ou no âmbito social: o respeito, o diálogo e a alteridade. Como já falamos, os diferentes perfis trazem multiplas formas de colaboração, enriquecendo o resultado do trabalho da equipe, mas é preciso libertar-se de interesses e críticas que venham a prejudicar a equipe e, consequentemente, o trabalho do setor.

Evitar a agressividade e o confronto direto é sempre a melhor alternativa. Ser transparente, falando a verdade de um jeito que não fira ninguém é um exercício diário para chegar ao estado de convivência harmoniosa que toda organização almeja. O líder que pode contar com a transparência de sua equipe, a qual não precisa ficar somente dizendo 'sim' a tudo, é um gestor privilegiado. Com isso, o indivíduo cresce, a equipe se fortalece e o trabalho é reconhecido.



Revista UCS - É uma publicação bimestral da Universidade de Caxias do Sul que tem como objetivo discutir tópicos contemporâneos que respondam aos anseios da comunidade por conhecimento.

O texto acima está publicado na décima sexta edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.

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