Estímulo ao controle biológico

JOSMARI PAVAN | jpavan@ucs.br
Fotos: Claudia Velho

Alimentos cultivados segundo os princípios da agricultura orgânica NÃO são APENAS sinônimo de saúde. Mais do que isso, representam uma alternativa para inibir a contaminação das lavouras por agrotóxicos. Porém, viabilizar esse tipo de agricultura em larga escala ainda é um desafio

Alimentos orgânicos, produzidos sem o uso de defensivos químicos agrícolas, têm conseguido cada vez mais espaço na mesa das pessoas pela garantia de que não agridem a saúde humana e o meio ambiente.

Levantamento realizado em 2012 pela Federação Internacional dos Movimentos de Agricultura Orgânica (IFOAM) indica que mais de 37,5 milhões de hectares são ocupados pela agricultura orgânica em todo o mundo. Desde o ano de 1999, essa área triplicou, levando-se em conta o cultivo em todos os continentes. Ainda segundo a IFOAM, a Oceania possui a maior área dedicada à agricultura orgânica, representando 12,2 milhões de hectares. Em seguida estão, respectivamente, Europa (11,2 milhões), América Latina (6,8 milhões), Ásia (3,2 milhões), América do Norte (3 milhões) e o continente Africano (1,1 milhões).

A América Latina, com seus quase 7 milhões de hectares, abriga 18% de toda área agrícola orgânica do planeta. O Brasil ocupa a quinta posição entre os países com a maior área de cultivo orgânico. Segundo dados do Ministério da Agricultura, o ano de 2013 fechou com 6.719 produtores e 10.064 unidades de produção orgânica em todo o Brasil, comparado a 2012. Um aumento de 22%.

Apesar da expansão percebida nos últimos anos, a agricultura orgãnica encontra na logística de produção um dos principais entraves para o seu desenvolvimento. Em culturas orgânicas, o combate de pragas e de doenças é realizado por meio do controle biológico. O método consiste em utilizar um organismo vivo para atacar outro que seja prejudicial à lavoura. Esse controle natural é uma alternativa ao uso de agrotóxicos.

Equipe de laboratório desenvolve pesquisas para o controle de pragas em culturas agrícolas. Uma das etapas consiste na criação de condições ideais para o desenvolvimento em laboratório, e posterior teste para combate, da Anticarsia gemmatalis, conhecida como como lagarta-da-soja. A espécie ataca culturas de soja no país inteiro, prejudicando a produtividade das lavouras.

A pesquisa na UCS

Com o objetivo de identificar e desenvolver formas eficazes de controle biológico, a Universidade de Caxias do Sul mantém pesquisas abrigadas no Instituto de Biotecnologia e no Centro de Ciências Biológicas e da Saúde.

Um dos estudos em controle biológico na UCS foca em combater lagartas que se tornaram pragas em culturas agrícolas de importância econômica. Um dos principais exemplos é a Anticarsia gemmatalis, conhecida como lagarta-da-soja, espécie que mais preocupa produtores de soja no país inteiro.

A professora Neiva Monteiro de Barros, coordenadora do Laboratório de Controle de Pragas do Instituto de Biotecnologia da UCS, e a professora Lúcia Bertholdo Vargas, pesquisadora do laboratório, conduzem estudos que provam a eficácia de um fungo, o Nomuraea rileyi, no controle da lagarta-da-soja. Conforme as pesquisadoras, testes mostram que o fungo é capaz de matar a lagarta agindo de forma seletiva (ou seja, sem prejudicar todos os organismos vivos do ambiente - incluindo os seres humanos). Por isso, o manuseio é mais seguro do que com os agrotóxicos. No entanto, além do tempo de resposta ser mais lento, a aplicação de defensivos alternativos está condicionada a condições climáticas favoráveis.

"O produto químico tem efeito quase imediato no controle da praga, mas em contrapartida tem ação sobre todos os seres vivos que estão na lavoura. Já o produto biológico tem um efeito mais lento, mas age apenas sobre a praga da lavoura", explica Neiva.

Integrar é a saída

As pesquisadoras são unânimes em afirmar que, para amenizar a contaminação química causada pelos agrotóxicos, a solução seria empregar o chamado controle integrado de pragas. Basicamente, trata da diminuição do uso de defensivos químicos com a inclusão de insumos orgânicos.

Aplicados em períodos diferentes, os produtos complementam-se na manutenção da lavoura. As pesquisas do laboratório avançam nesse sentido. Porém, a parceria com empresas poderia acelerar o oferecimento de produtos alternativos no mercado.

Controle de patologias a partir de substâncias extraídas das plantas, os chamados óleos essenciais.

"Precisamos investir na transferência do conhecimento ao agricultor quanto aos efeitos dos agrotóxicos e à importância da introdução de produtos biológicos para o controle de pragas. É preciso o entendimento geral de que os venenos, que estão nos alimentos, no solo e na água, acumulam-se no organismo ao longo dos anos, podendo causar doenças", destaca Lúcia.

Controle com óleos de plantas

Colocar um defensivo agroecológico no mercado é um processo burocrático, que esbarra na legislação e nos altos custos para liberação de patentes.

A dificuldade em atrair a confiança do produtor, bastante acostumado ao funcionamento dos produtos químicos, completa a lista de dificuldades para tornar o defensivo alternativo menos popular nas lavouras. "Infelizmente, o agrotóxico é sinônimo de lucro garantido, enquanto o biológico ainda depende de uma série de pesquisas, já que a legislação brasileira coloca no mesmo nível produtos químicos e biológicos", explica Joséli Schwambach, coordenadora do Laboratório de Biotecnologia Vegetal, que faz parte do Instituto de Biotecnologia e Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da UCS.

Joséli conduz estudos com óleos essenciais, substâncias extraídas das plantas, no controle de patologias em variedades locais, como hortifrutis em geral e videiras. Já foram testados óleos essenciais de 18 espécies de plantas. Tanto a análise química (realizada no Laboratório de Análises Químicas) quanto a extração são feitas no próprio laboratório.

Os fungos agressores são coletados em campo e, em seguida, iniciam-se os testes para ver quais óleos atacam os fungos identificados. Esta etapa pode levar semanas, já que também é preciso descobrir as quantidades corretas e condições ideais de aplicação. Tudo para tornar o produto viável comercialmente, sem prejuízos ao meio ambiente.

"Nossas pesquisas precisam desenvolver produtos que tragam mais resultados com a menor concentração de matéria-prima possível. O custo-benefício do processo precisa ser considerado", destaca.

Equipe do laboratório de Agricultura Orgânica ouve relatos de agricultores sobre os resultados dos métodos de adubagem orgânica empregados nas culturas de tomate e de caqui. Após a troca de experiências, os pesquisadores ensinam uma fórmula de biofertilizante ideal para variedades como couve-flor e brócolis.

Conscientização na lavoura

Com o objetivo de ampliar a agricultura orgânica e sua eficácia produtiva, o Laboratório de Agricultura Orgânica, que integra o Núcleo de Inovação e Desenvolvimento da Agricultura Sustentável, valida insumos alternativos usados em áreas agrícolas da região.

A equipe do laboratório se dedica a testar e aprimorar insumos orgânicos. Compostagem, extratos e fermentados vegetais são analisados e testados pela equipe do laboratório, que confirma se os produtos estão dentro das normas necessárias para a agricultura orgânica. A professora Valdirene Camatti Sartori, que está à frente do trabalho, explica que a validação dos insumos auxilia os produtores a alcançar maior produtividade em suas plantações. Muitas falhas em adubação de culturas regionais já foram sanadas graças aos resultados das pesquisas.

Além das pesquisas com insumos, o laboratório também se dedica a conscientizar sobre o uso de agrotóxicos. A equipe da professora Valdirene está à frente da organização do único evento da região serrana com o objetivo de discutir alternativas de desenvolvimento para a agroecologia. Trata-se do 5º Encontro Caxiense para o Desenvolvimento da Agricultura Orgânica e Sustentável, realizado de 2014 juntamente com e 3ª Reunião Sul Brasileira sobre Agricultura Sustentável.

"Por que hoje há mais incidência de câncer e de intolerâncias alimentares nas pessoas? Isso não acontece do nada. O trabalho tenta mostrar para os agricultores que há alternativas mais saudáveis. Eles são receptivos às ideias, mas ainda têm medo de perder a produção por desconhecerem os métodos alternativos utilizados na produção de alimentos orgânicos", destaca a pesquisadora.



Revista UCS - É uma publicação bimestral da Universidade de Caxias do Sul que tem como objetivo discutir tópicos contemporâneos que respondam aos anseios da comunidade por conhecimento.

O texto acima está publicado na décima sexta edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.

Veja outras matérias da Revista.